Como um Romance
O Grupo de Leitores da BM Algés reuniu, a 12 e a 19 deste mês, para conversar sobre Como um Romance, obra de Daniel Pennac. A escolha não foi inocente, na medida em que se pretendia dessacralizar o acto de ler, dando o devido ênfase ao prazer por ele proporcionado. O autor disserta sobre o assunto de forma bem-humorada, sensível e inteligente e consegue, como poucos, romancear dicas e truques, conselhos e práticas, transformando o que poderia ser entendido como uma obra eminentemente técnica – que o é, também –, num quase romance. Ler não pode ser uma obrigação, nem uma recompensa, nem um sacrifício. Ler deve ser uma prenda, uma dádiva, tal como era quando nos liam em voz alta, antes do sono. Transformar a leitura num castigo, numa tarefa exclusivamente académica, é matar a criação de futuros leitores, ainda mais quando, tantas vezes, são os adultos que, em relação aos seus próprios filhos, encetam a cruzada dessa necessidade imperiosa de ler mas… sentados nos seus tronos de telespectadores. Tal como diz o provérbio: bem prega Frei Tomás…
Da conversa foram saindo histórias sobre a leitura, como a realidade já distante de se procurar, nos textos literários, a educação sexual que não era transmitida nem pelas escolas nem pela família; de se proibir a leitura d’A Ilha dos Amores, n’Os Lusíadas; de existirem livros que marcam e que não se tornam a ler, pelas recordações tão vivas e dolorosas que trazem; reflectiu-se sobre a experiência traumática que representa, para uma criança, sentir a leitura como um acto de amor, num momento, e numa tarefa árdua e difícil, no seguinte; ouviu-se uma concisa – mas excelente – recensão sobre o último título de Pennac (Chagrin d’école) pela Helena, autobiografia em que o autor dá a conhecer o seu terrível percurso escolar, com notas fracas a todas as disciplinas (o que levou também o grupo a dissertar sobre se tal teria tido influência na sua forma de ensinar). A discussão manteve a sua pertinência com a análise da citação “Que espantosos pedagogos que nós éramos, quando não nos preocupávamos com a pedagogia.”
A propósito de leitura em voz alta, Miguel Torga e Mário Viegas visitaram o grupo, contando o primeiro “A consoada do Garrincha” e recitando o segundo, como só ele sabia, o “Boletim Meteorológico”. Visualizaram-se pequenos spots publicitários de promoção da leitura, uma entrevista com Fernando Savater e Ana Sousa Dias (em que o filósofo partilha das opiniões de Pennac), e ainda houve tempo para um olhar sobre o futuro do livro. Sobre a mesa, entre chás e bolinhos, obras de José Afonso Furtado, Jorge Luís Borges, Roger Chartier, Marcel Proust, Alberto Manguel e, em representação dos BMO’s, os 10 livros que mudaram o mundo. Uma última nota para uma intervenção virtual da Joana, que enviou e-mail manifestando a sua tristeza por não poder estar presente. Cito esta pérola: “Estou com um bocadinho de inveja, faz tanta falta pensar a conversar”. Lindo!
Em suma, duas sessões que, sem romance, começaram Como um Romance, ficando o dito para Março, com O Leitor, de Bernhard Schlink.
Em suma, duas sessões que, sem romance, começaram Como um Romance, ficando o dito para Março, com O Leitor, de Bernhard Schlink.
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