segunda-feira, 12 de março de 2007

AS NOSSAS SUGESTÕES - MARÇO DE 2007

Título: A Espuma dos Dias
Autor: Boris Vian

De quem se fala: Nascido em Ville d’Avray em 1920, Boris Vian, que em 1959 sucumbiu a um ataque quando assistia à projecção de um filme baseado num dos seus romances, nunca reduziu a sua vida a uma profissão exclusiva. Interessou-se, e com igual entusiasmo, por actividades tão diversas como a matemática, a música (jazz, canções, comédias musicais), o jornalismo, a pintura, a mecânica, o cinema… Assim, a faceta de escritor é uma entre muitas. Das mais cativantes, talvez. Nas obras literárias de Boris Vian, o verbo é feito Deus, a palavra surge recriada a partir de si mesma. A irracionalidade, o absurdo, a fantasia, o humor, o paradoxo, a poesia, a ternura, o sonho, a irreverência, a provocação e o desprezo pelas convenções sociais são alguns dos aspectos mais vincados dos seus escritos.

O que se diz: A Espuma dos Dias que Raymond Queneau classificou de “o mais lancinante romance de amor contemporâneo”, tudo concorre para tornar irremediável um amor puro, que não encontra lugar no mundo em que vivemos. O próprio tom satírico que perpassa por todo o livro mais contribui para relevar, muito ambiguamente, a angústia que quase desde o início deixa pressentir, por entre a ternura de Vian frente às suas próprias personagens – adultos com alma de adolescentes.

Está dito: “- Nicolas – disse Colin ao entrar –, apresento-lhe o meu amigo Chick.
- Boa noite – disse Nicolas.
- Boa noite Nicolas – respondeu Chick.
- Não tem, por acaso, uma sobrinha chamada Alise?
- Tenho sim senhor - disse Nicolas. - Aliás uma bonita rapariga, se me atrevo a proferir tal comentário.
- É muito parecida consigo – disse Chick –, apesar de haver algumas diferenças a respeito do busto.
- Sou bastante largo – disse Nicolas – mas ela é mais desenvolvida no sentido perpendicular, se o senhor tiver a bondade de me permitir tal precisão.
- Claro que sim – disse Colin –, estamos quase em família. Não me contou que tinha uma sobrinha, Nicolas.
- Senhor, a minha irmã degenerou – disse Nicolas. - Andou a estudar filosóficas. Não são coisas que uma família orgulhosa das suas tradições goste de gabar...”

Relógio d'Água, 208 pag.

Título: Montanha Mágica
Autor: Thomas Mann

De quem se fala: Escritor alemão, Thomas Mann nasceu em Lübeck, a 6 de Julho de 1875 e faleceu em Zurique, Suiça, a 12 de Agosto de 1955. Era filho de um senador e comerciante de Lübeck e sua mãe tinha ascendência portuguesa. Depois da morte do pai, a família radicou-se em Munique, onde Thomas Mann inicia a sua actividade literária. Em 1929 recebe o Prémio Nobel da Literatura. A implantação do nacional-socialismo na Alemanha levou-o a emigrar, em 1933, para a Checoslováquia, Suiça e E.U.A. Em 1952 regressa à Europa e fixa-se na Suiça definitivamente. Mann deu ao romance alemão uma projecção universal, cultivando também o gosto pela novela e pelo ensaio. Foi profundamente influenciado por Schopenhauer, Wagner, Nietzsche, Tolstoy, Dostoiewski, Goethe e Schiller.

O que se diz: A montanha Mágica é uma enciclopédia romanesca da vida, em que há páginas inesquecíveis de beleza e insólita originalidade. Um monumento de arte, cuja grandeza transcende todas as normas da criação literária.

Está dito: “Com respeito à natureza do tédio encontram-se frequentemente conceitos erróneos. Crê-se em geral que a novidade e o carácter interessante do seu conteúdo "fazem passar" o tempo, quer dizer, abreviam-no, ao passo que a monotonia e o vazio estorvam e retardam o seu curso. Mas não é absolutamente verdade. O vazio e a monotonia alargam por vezes o instante ou a hora e tornam-nos "aborrecidos"; porém, as grandes quantidades de tempo são por elas abreviadas e aceleradas, a ponto de se tornarem um quase nada. Um conteúdo rico e interessante é, pelo contrário, capaz de abreviar uma hora ou até mesmo o dia, mas, considerado sob o ponto de vista do conjunto, confere amplitude, peso e solidez ao curso do tempo, de tal maneira que os anos ricos em acontecimentos passam muito mais devagar do que aqueles outros, pobres, vazios, leves, que são varridos pelo vento e voam. Portanto, o que se chama de tédio é, na realidade, antes uma simulação mórbida da brevidade do tempo, provocada pela monotonia: grandes lapsos de tempo quando o seu curso é de uma ininterrupta monotonia chegam a reduzir-se a tal ponto, que assustam mortalmente o coração; quando um dia é como todos, todos são como um só; e numa uniformidade perfeita, a mais longa vida seria sentida como brevíssima e decorreria num abrir e fechar de olhos.”

Livros do Brasil, 748 pag.


Título: O Jogo das contas de vidro
Autor: Hermann Hesse

De quem se fala: Nascido em Calw, na Alemanha, em 2 de Julho de 1877, e cidadão suíço desde 1923, Hermann Hesse cedo revelou a vocação literária que o faria abandonar os estudos de Teologia e a carreira religiosa para que tinha sido encaminhado. A escolha foi acertada, pois manejou como mestre a poesia e a prosa. Considerado um dos maiores escritores do século XX. O jogo das contas de vidro, valeu-lhe a atribuição do Prémio Nobel de literatura em 1946.

O que se diz: O Jogo das Contas de Vidro, de Hermann Hesse é uma fábula sobre o jogo como utopia total. Para Hesse, «o Jogo das Contas de Vidro é um jogo que joga com todos os conteúdos e valores da nossa cultura, um pouco como nos tempos áureos das artes um pintor terá brincado com as cores da sua paleta», como um órgão é tocado (em inglês, «jogado») por um organista. Acrescentaríamos hoje: como um computador é jogado por um matemático.

Está dito:
“A serenidade não é feita nem de troça nem de narcisismo, é conhecimento supremo e amor, afirmação da realidade, atenção desperta junto à borda dos grandes fundos e de todos os abismos; é uma virtude dos santos e dos cavaleiros, é indestrutível e cresce com a idade e a aproximação da morte. É o segredo da beleza e a verdadeira substância de toda a arte. O poeta que celebra, na dança dos seus versos, as magnificências e os terrores da vida, o músico que lhes dá os tons de duma pura presença, trazem-nos a luz; aumentam a alegria e a clareza sobre a Terra, mesmo se primeiro nos fazem passar por lágrimas e emoções dolorosas. Talvez o poeta cujos versos nos encantam tenha sido um triste solitário, e o músico um sonhador melancólico: isso não impede que as suas obras participem da serenidade dos deuses e das estrelas. O que eles nos dão, não são mais as suas trevas, a sua dor ou o seu medo, é uma gota de luz pura, de eterna serenidade. Mesmo quando povos inteiros, línguas inteiras, procuram explorar as profundezas cósmicas em mitos, cosmogonias, religiões, o último e supremo termo que poderão atingir é essa serenidade.”

Dom Quixote, 445 pag.

Título: Diário inventado de um menino já crescido
Autor: José Fanha

De quem se fala: José Fanha nasceu em 1951. É arquitecto, professor e formador de professores, poeta, escritor de histórias e poesia para a infância. Guionista de televisão e cinema. Dramaturgo. Declamador e animador cultural desde o tempo em que acompanhava o Zeca, o Adriano e os outros. Percorre escolas e bibliotecas orientando oficinas de escrita e comunidades de leitores. Divulgador de poesia, traficante de palavras claras, contrabandista de sonhos, habitante da solidariedade e da utopia, cidadão de corpo inteiro desde sempre e enquanto durar.

O que se diz: Todos nós vivemos acontecimentos extraordinários, conhecemos pessoas especiais, presenciamos momentos irrepetíveis. O problema é que, quando começamos a crescer, começamos também a esquecer muitos desses acontecimentos, dessas pessoas, desses momentos. É para isso que servem os Diários. Para guardar a nossa memória.
Este Diário é um bocadinho verdadeiro e um bocadinho inventado.

Está dito: “O que eu mais gosto é de me lembrar do dia em que a minha avó ia receber a pensão. Levava-me sempre a comprar um soldadinho e a comer um bolo na Mexicana. Bem... A Mexicana não era mesmo mexicana. Era uma pastelaria portuguesa na Praça de Londres. E a Praça não era de Londres nem era preciso ir a Londres para lá chegar. A Praça de Londres fica em Lisboa. Ali ao pé da Avenida de Paris. Que também não tinha nada a ver com Paris mas era onde a minha avó ia receber a pensão. (…) E só a minha avó é que era mesmo a minha avó. A pessoa mais bonita e mais doce que eu conheci na minha vida.”

Gailivro, 63 pag.

Título: O insólito Mr Mee
Autor: Andrew Crumey

De quem se fala: Andrew Crumey nasceu em Glasgow, no ano de 1961. Estudou Física Teórica na St. Andrews University e no Imperial College e actualmente vive em Newcastle. É autor de Music, in a Foreign Language, que lhe valeu um prémio Scotkan’s Saltire for Best First Novel. Outros dois livros, respectivamente, D’Alembert’s Principle e Pfitz e a cidade inventada foram distinguidos com o prémio New York Times Notable Book.

O que se diz: Mr Mee, o genial octogenário decide trocar as idas frequentes à biblioteca e os milhares de páginas que lhe enchem as estantes por um aparelho chamado “computador”, onde lhe afiançaram que poderá encontrar todas as referências de que precisa. Tudo começa por causa de um pneu furado e de um aguaceiro. O insólito Mr Mee, alheado há décadas do mundo real, enquanto espera o regresso do mecânico à oficina, descobre, num alfarrabista, a menção a uma enciclopédia alternativa do Universo, escrita no século XVIII por um autor que desconhece. As suas buscas cibernéticas deste misterioso Jean-Bernard Rosier levam-no, porém, aos mais inesperados destinos, que incluem, além da descoberta do sexo e das drogas, a obra de Dr. Petrie – um professor de meia-idade apaixonado por um aluna – sobre Ferrand e Minard, dois contemporâneos de Rousseau contratados para copiar a dita enciclopédia, cujas deambulações, perseguições, equívocos e desventuras constituem certamente as mais hilariantes páginas deste livro. A junção de três histórias – aliada à extravagância, ao humor e ao brio intelectual – resulta uma narrativa que, apesar de cómica, não deixa de ser profundamente e verdadeiramente tocante.

Está dito: “- Temos que fazer uma pesquisa na Internet! – disse-me, quase sem conseguir respirar pela antecipação dos possíveis resultados. (…) Convidou-me então a sentar-me à frente do ecrã de um PC – nos últimos anos a biblioteca tinha sido invadida por vários ‘bichos’ desses, sem que eu alguma vez lhes tivesse prestado a mínima atenção, pois tinha-me convencido de que eram um meio de propaganda patrocinado pelo centro de turismo local. Margareth mando-me introduzir uma ‘palavra-chave’ no ‘motor de busca’ e eu, com um só dedo (…) escrevi a palavra ‘Rosier’ (…). Tenho de reconhecer que os resultados foram impressionantes (…). Esta abundância foi quase uma desilusão; era uma flor rara que, instantaneamente, se transformava em erva daninha. Como iria eu abrir caminho por entre tanta informação?”

Temas & Debates, 270 pag.

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