«O PROBLEMA DE SER NORTE» - Poesia Nova de FILIPA LEAL
UMA ONTOLOGIA POÉTICA...
“Não dormia sem o escuro absoluto. / Doíam-lhe os olhos de ter visto cidades, / de ter esquecido gente, do frio do vidro nas palavras. Demorava tanto / a entender o mundo que agora não dormia / de muita luz que as coisas tinham / antes sequer de serem suas”, Filipa Leal
“(…) e para quê poetas em tempos de indigência?/Mas eles são, dizes tu, como os santos sacerdotes do deus do vinho,/ Que iam de terra em terra em noite sagrada.”, Hölderlin
Para quê poetas em tempos de indigência? Interrogava-se Hölderlin e, com ele, Heidegger. Ser “poeta em tempo indigente significa: cantar, tendo em atenção o vestígio dos deuses foragidos. É por isso que, no tempo da noite do mundo, o poeta diz o sagrado”, diz-nos o filósofo de Ser e Tempo. Para Hölderlin vagueamos na noite da actualitas presos ao labor infrene e estéril, onde apenas nos escutamos a nós próprios, sem ouvidos para o Espírito da Natureza e para a palavra da madrugada da Hélade.
Lembramo-nos desta interrogação de Hölderlin após a leitura do livro de poemas de Filipa Leal, O Problema de Ser Norte. Na verdade, no sussurro nocturno da palavra impressa no hálito branco destas páginas, perpassa o que apelidaríamos de uma ontologia poética com uma ideia “como a natureza do início / lá para trás, uma ideia louca (…) / como os primeiros, os que se atreveram” (p. 27) que se contrapõe, se assim o podemos dizer, ao inautêntico dos tempos de indigência denunciados pelo poeta alemão, ontologia poética patente, assim o entendemos, no poema de abertura da primeira parte da arte poética de O Problema de Ser Norte:
Era um verso com árvores à volta,
Tinha o problema de ser norte
e dia e tão contrário à natureza. (O Problema de Ser Norte, p.11)
Confrontamo-nos, deste modo, com um problema, a consciência de ser norte, identidade metafísica, experiência interior de vida (Jorge de Sena) ou arte do ser (Sophia de Mello Breyner) que se procura e que nos procura, a par com uma paisagem preenchida pelas árvores em círculo que rodeiam o eu do poeta, lá “no fundo, em baixo, nas escadas/de pedra” (id.) Uma dessas árvores é a “árvore que dava todos os frutos/(…) árvore que dava palavras” (A minha árvore, p. 20). Devemos ainda considerar, na construção do poema, a “linha fonética no vidro / Linha como árvore obsessiva deste livro, / como linha verdadeira, como página que se organiza por causa dela.” (Linha fonética, p. 21). As árvores simbolizam, pois, a imagem essencial, “a única paisagem” (p.11) do verso e da questão ontológica de ser norte. O mar, a cidade, os livros, os mapas, são outras paragens em que se detém o verso.
“Não dormia sem o escuro absoluto. / Doíam-lhe os olhos de ter visto cidades, / de ter esquecido gente, do frio do vidro nas palavras. Demorava tanto / a entender o mundo que agora não dormia / de muita luz que as coisas tinham / antes sequer de serem suas”, Filipa Leal
“(…) e para quê poetas em tempos de indigência?/Mas eles são, dizes tu, como os santos sacerdotes do deus do vinho,/ Que iam de terra em terra em noite sagrada.”, Hölderlin
Para quê poetas em tempos de indigência? Interrogava-se Hölderlin e, com ele, Heidegger. Ser “poeta em tempo indigente significa: cantar, tendo em atenção o vestígio dos deuses foragidos. É por isso que, no tempo da noite do mundo, o poeta diz o sagrado”, diz-nos o filósofo de Ser e Tempo. Para Hölderlin vagueamos na noite da actualitas presos ao labor infrene e estéril, onde apenas nos escutamos a nós próprios, sem ouvidos para o Espírito da Natureza e para a palavra da madrugada da Hélade.
Lembramo-nos desta interrogação de Hölderlin após a leitura do livro de poemas de Filipa Leal, O Problema de Ser Norte. Na verdade, no sussurro nocturno da palavra impressa no hálito branco destas páginas, perpassa o que apelidaríamos de uma ontologia poética com uma ideia “como a natureza do início / lá para trás, uma ideia louca (…) / como os primeiros, os que se atreveram” (p. 27) que se contrapõe, se assim o podemos dizer, ao inautêntico dos tempos de indigência denunciados pelo poeta alemão, ontologia poética patente, assim o entendemos, no poema de abertura da primeira parte da arte poética de O Problema de Ser Norte:
Era um verso com árvores à volta,
Tinha o problema de ser norte
e dia e tão contrário à natureza. (O Problema de Ser Norte, p.11)
Confrontamo-nos, deste modo, com um problema, a consciência de ser norte, identidade metafísica, experiência interior de vida (Jorge de Sena) ou arte do ser (Sophia de Mello Breyner) que se procura e que nos procura, a par com uma paisagem preenchida pelas árvores em círculo que rodeiam o eu do poeta, lá “no fundo, em baixo, nas escadas/de pedra” (id.) Uma dessas árvores é a “árvore que dava todos os frutos/(…) árvore que dava palavras” (A minha árvore, p. 20). Devemos ainda considerar, na construção do poema, a “linha fonética no vidro / Linha como árvore obsessiva deste livro, / como linha verdadeira, como página que se organiza por causa dela.” (Linha fonética, p. 21). As árvores simbolizam, pois, a imagem essencial, “a única paisagem” (p.11) do verso e da questão ontológica de ser norte. O mar, a cidade, os livros, os mapas, são outras paragens em que se detém o verso.
A DAR CONTINUIDADE BREVEMENTE!
IN "FILIPA LEAL – “O PROBLEMA DE SER NORTE”,
UMA ONTOLOGIA POÉTICA."
Texto do colaborador «das Artes das Letras»
Jorge Costa Lopes;
IN "FILIPA LEAL – “O PROBLEMA DE SER NORTE”,
UMA ONTOLOGIA POÉTICA."
Texto do colaborador «das Artes das Letras»
Jorge Costa Lopes;
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