sexta-feira, 11 de abril de 2008

A violência do silêncio

Duas irmãs partilham um segredo. Duas irmãs dão-nos pinceladas dos seus trajectos de vida, percursos assombrados pela confidência que só tardiamente verbalizarão. Para o leitor fica a composição final desta tela mansa e delicada, sensível e profunda que é a obra de Adriana Lisboa: Sinfonia em Branco. Desde logo tal prenuncia uma escolha certa, para discussão no seio do Grupo de Leitores. Há muito a dissertar, a imaginar, a potenciar neste enredo. E isso manifestou-se na conversa deste mês.

Da tragédia profunda que é narrada, apenas alguns sinais. Houve quem afirmasse que a violência do silêncio foi o mais marcante nesta obra. Impressiona a capacidade da autora em aflorar um tema tão incómodo e dramático sem utilizar, por uma única vez e nas duzentas e tal páginas que compõem o título, o vocábulo que lhe dá nome. Clarice e Maria Inês (as duas irmãs) são, em abono da verdade, duas realidades paralelas: porque ambas sofrem, ambas são vítimas, de formas diferentes mas pelo mesmo motivo. Se a mais velha encarna a obediente, a submissa (que acaba por ser aquela que assume de forma mais evidente as suas cicatrizes), Maria Inês tem em si a força para criar um mundo perfeito, sem nunca se sentir bem nesse papel: a sua casa branca, as suas vestes brancas, nunca lhe trarão a candura perdida.

O final é particularmente redentor. Mas, mais não se pode dizer, sob risco de levantar o véu a uma escrita que merece ser lida com olhos de ler. Aliás, outra das impressões que o Grupo de Leitores da BM Algés deixou sobre este livro é precisamente a vontade que fica em reler esta Sinfonia em Branco.

Um último apontamento: homenageando a autora – brasileira –, a Augusta brindou-nos com uma outra obra de arte, mas não literária. Culinária, isso sim: bolo de milho e coco, de comer e chorar por mais. Se a alma já estava saciada, o estômago não lhe ficou atrás. Voltamos para o próximo mês, num registo bem diferente e que pôs os participantes de pulga atrás da orelha. Vamos falar de uma Breve História dos Tractores em Ucraniano. Veremos se se incrementam estes conhecimentos agro-pecuários : - )
imagem de Sinfonia em Branco, de James Whistler aqui

4 comentários:

Sofia Sousa disse...

mensagem muito agradável de ler! Gosto sempre da tua "escrita" Gaspar.

SS

Gaspar Matos disse...

Obrigado, Sofia! Então e essa exposição?

Anónimo disse...

Olá Gaspar,

Gostei muito do teu comentário! Apesar de não ter podido estar presente deu-me uma ideia.
A tua escrita é, sem dúvida, muito agradável. Pena que fiquei sem bolo!
Teresa Cordeiro

Gaspar Matos disse...

Então não faltes à próxima, Teresa. Considerando que a autora nasceu na Ucrânia, talvez alguém se aventure na gastronomia da Europa Oriental :-)
Um abraço!