Kafka à beira mar na Biblioteca Municipal de Oeiras
Kafka à beira mar de Haruki Murakami, liga a história de dois homens, o jovem Kafka Tamura de 15 anos e o caçador de gatos, Nakata. Kafka é um rapaz maduro, que foge de casa, de um pai cuja presença será fará sentir sobre a forma de uma profecia à maneria da história de Édipo. Ao longo da história, por entre mundos paralelos onde o tempo não existe, conversas com a andrógina Oshima e romance com o passado de alguém, Kafka descobre o mundo ao descobrir-se a si, a sua sexualidade e quem é na verdade.
Nakata é alguém que sente a cabeça vazia, fruto de um segredo militar que se vai desvendar e que por a isso consegue conversar com gatos. Pelo meio, Nakata conhece Hoshino, o camionista que vê nele o avô e que será a sua bengala, por entre procuras de pedras mágicas e conversas com o Coronel Sanders.
Eis um livro que não fala do fantástico, usa o fantástico como metáfora, com maior ou menor sucesso, para falar do passado, do presente e do futuro. O presente, neste mundo de fronteiras temporais pouco definidas, é um modo de experienciar a nossa história com os nossos anseios. Aqui fala-se de amizade, de construir o futuro sem os erros do passado, de procurar um sentido último, bem para além das convenções sociais. Um livro que ultrapassa as barreiras culturais, no nosso meio literário não habituado a romances comerciais tão repletos de peixes que caem do céu, prostitutas que citam Hegel e uma floresta que abriga soldados que não sabem o que é envelhecer desde os dias da Segunda Guerra Mundial. Assiste-se, ainda, a uma morte brutal, só que tanto a identidade da vítima como a do assassino permanecerão um mistério.
Trata-se, no caso, de uma clássica, mas diferente história de demanda e, simultaneamente, de uma arrojada exploração de tabus, só possível graças ao enorme talento de um dos maiores contadores de histórias da actualidade.
Em Kafka à Beira-Mar o texto puxa-nos de modo hipnótico para um universo interessante mas que podemos chegar a não perceber. Este não será um livro de fácil leitura porque não é um livro simples, mas antes um livro de escrita elegante e fluente, com um sentido estético, poético e musical elevadíssimo, mas cuja trama não se desenrola de forma linear. De tal forma, que mesmo chegado ao fim do livro, o leitor interroga-se mais do que se esclarece
O Grupo de Leitores ficou fascinado pela capacidade de articulação, cruzamento e combinação de diferentes enredos, personagens, referências históricas e culturais e de momentos chave da vida do quotidiano. Para além da conversar em torno da história fantástica de Tamura e Nakata, a discussão abordou os temas da sexualidade, do fantástico e as questões possíveis relacionadas com a física, a relação espaço-tempo e os fenómenos que só a ciência consegue e pode explicar.
Img: murakami.ch
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