O Ano da Morte de Ricardo Reis em 2012
Durante o mês de Abril o Grupo de Leitores da Biblioteca Municipal de Oeiras esteve a ler O ano da morte de Ricardo Reis, de José Saramago. Ao longo das 2 sessões habituais muito se falou sobre Lisboa, o Estado Novo, Política, Fernando Pessoa e Ricardo Reis. Partindo dos conhecimentos individuais, do impacto político e social do Estado Novo e do heterónimo de Fernando Pessoa, abordamos diferentes perspectivas deste história que coloca Fernando Pessoa e Ricardo Reis frente a frente.
O Ano da Morte de Ricardo Reis é um romance escrito em 1984 por José Saramago cuja personagem principal é o heterónimo, de Fernando Pessoa, Ricardo Reis.
Após 16 anos a viver exilado no Brasil, Ricardo Reis regressa a Lisboa em 1936, observando e testemunhando o desenrolar de um ano trágico, através do qual somos levados a sentir o clima sombrio provocado pela ascenção do fascismo na sociedade, antevendo-se um futuro negro na história de Portugal, Espanha e Europa.
Neste livro José Saramago tenta corrigir a história ao "substituir o que foi pelo que poderia ter sido"... mas isso não significa que tenho corrigido os factos históricos. Ainda numa perspectiva histórica Saramago conta-nos como "conheceu" Ricardo Reis:
"Mas foi na biblioteca da escola industrial que O Ano
da Morte de Ricardo Reis começou a ser escrito... Ali encontrou um dia o
jovem aprendiz de serralheiro (teria então 17 anos) uma revista - "Atena" era o
título - em que havia poemas assinados com aquele nome e, naturalmente, sendo
tão mau conhecedor da cartografia literária do seu país pensou que existia em
Portugal um poeta que se chamava assim: Ricardo Reis. Não tardou muito tempo,
porém, a saber que o poeta propriamente dito tinha sido um tal Fernando Nogueira
Pessoa que assinava poemas com nomes de poetas inexistentes nascidos na sua
cabeça e a que chamava heterónimos, palavra que não constava dos dicionários da
época, por isso custou tanto trabalho ao aprendiz de letras saber o que ela
significava. Aprendeu de cor muitos poemas de Ricardo Reis ("Para ser grande sê
inteiro/Põe quanto és no mínimo que fazes"), mas não podia resignar-se, apesar
de tão novo e ignorante, que um espírito superior tivesse podido conceber, sem
remorso este verso cruel: "Sábio é o que se contenta com o espectáculo do
mundo". Muito, muito tempo depois, o aprendiz, já de cabelos brancos e um pouco
mais sábio das suas próprias sabedorias, atreveu-se a escrever um romance para
mostrar ao poeta das "Odes" alguma coisa do que era o espectáculo do mundo nesse
ano de 1936 em que o tinha posto a viver os seus últimos dias: a ocupação da
Renânia pelo exército nazista, a guerra de Franco contra a República espanhola,
a criação por Salazar das milícias fascistas portuguesas. Foi como se estivesse
a dizer-lhe: "Eis o espectáculo do mundo, meu poeta das amarguras serenas e do
cepticismo elegante. Disfruta, goza, contempla, já que estar sentado é a tua
sabedoria..."
O Ano da Morte de Ricardo Reis terminava
com umas palavras melancólicas: "Aqui, onde o mar se acabou e a terra espera".
Portanto, não haveria mais descobrimentos para Portugal, apenas como destino uma
espera infinita de futuros nem aos menos inimagináveis: só o fado do costume, a
saudade de sempre, e pouco mais..."
Excerto do discurso de José Saramago perante a Real Academia Sueca
Img: FLUL
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